Entendendo a ecolalia no autismo

O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é caracterizado por prejuízos na comunicação e interação social e no comportamento. Entre os diversos aspectos da linguagem no autismo, a ecolalia é muito comum.

A ecolalia é um distúrbio de linguagem que faz com que a criança repita tudo o que ouve como um eco ou usam palavras aleatórias fora de contexto.

Elas também podem ser descritas como estereotipias verbais. A definição mais utilizada é “uma repetição em eco da fala” que foi descrita em 1943.

Saiba mais em: O que o TEA?

Cabe ressaltar que a ecolalia, na verdade, faz parte normal do desenvolvimento infantil. E à medida que as crianças aprendem a falar, imitam os sons que ouvem.

No entanto, à medida que as crianças crescem, elas começam a utilizar a linguagem de maneira mais sofisticada para expressar desejos, necessidades e ideias e não fazem mais o uso das ecolalias (por volta dos 2 anos de idade a criança já deve começar a diminuir as ecolalias). Mas, em crianças com autismo é comum que a ecolalia persista após os 3 anos de idade e isso é um sinal de alerta para o TEA, principalmente quando a ecolalia é usada fora do contexto.

A ecolalia é um dos sintomas mais comuns entre as características da linguagem no autismo. 

Algumas crianças e também adultos imitam os sons da fala sem entender o significado por trás desses sons. A ecolalia pode surgir como uma resposta à sobrecarga sensorial, onde a repetição de palavras ou frases oferece uma forma de lidar com desafios sensoriais.

Em alguns casos a ecolalia pode não ter nenhum significado de comunicação e ocorrer como uma ferramenta para que o autista se acalme. Neste caso, ela é considerada uma forma de auto-estimulação da mesma forma que ocorre com outras estereotipias.

Tipos de Ecolalia

A ecolalia pode ser imediata, mediata (conhecida como tardia) ou mitigada.

Na ecolalia imediata a criança repete as palavras logo depois de ouvi-las. Ou seja, a criança repete imediatamente após ouvir algo, como se estivesse ecoando as palavras.

Na ecolalia tardia a repetição ocorre após um intervalo de tempo significativo. A pessoa pode armazenar uma expressão ou frase na memória e repeti-la em outro momento, muitas vezes fora de contexto.

Já a ecolalia mitigada caracteriza-se por situação em que podem ser feitas modificações da emissão ecoada, seja imediata ou tardia, para fins comunicativos funcionais. Portanto, a ecolalia mitigada é uma variação em que o indivíduo repete ou modifica palavras e frases ouvidas, incorporando-as em sua própria comunicação.

É importante compreender que a ecolalia, quando funcional, desempenha um papel valioso na comunicação para indivíduos autistas.

Compreendendo melhor a ecolalia

Vários estudos indicam que a ecolalia imediata sugere a intenção comunicativa da criança. Por isso, acredita-se que é uma forma dela se comunicar com o outro ou manter o diálogo.

Pesquisadores que estudam a ecolalia observaram padrões na maneira como ela progride em crianças com TEA. Geralmente, as crianças repetem trechos da linguagem sem entender o que elas significam. Depois começam a modificar esses trechos, misturam e recombinam palavras e frases que usaram. A partir do momento que começam a entender mais a linguagem, algumas crianças usam frases mais curtas ou apenas uma ou duas palavras para se expressar.

Dessa forma, a linguagem se torna mais espontânea e flexível. É comum também que a ecolalia seja usada ocasionalmente, especialmente quando a criança está cansada, confusa ou frustrada. 

Diversos pesquisadores consideram a ecolalia apenas como uma característica comum das dificuldades de linguagem no TEA. Porém, é importante buscar compreender a pessoa que fala e se isso não atrapalha o desenvolvimento da comunicação, além de prejudicar na reciprocidade e o contato com outras pessoas.

Um profissional consegue diagnosticar a ecolalia conversando com a pessoa e observando os seus comportamentos e se há repetição de fala.  A ecolalia tem uma função e temos que descobrir qual é e ajudar a moldar a linguagem para que ela seja flexível e funcional. 

Independentemente da utilidade da ecolalia para a pessoa com autismo, o hábito pode interferir na interação social e no aprendizado. Portanto, a maioria dos pesquisadores se concentra em ajudar a pessoa a mudar para uma forma mais funcional de linguagem. Além disso, sabe-se que a pessoa com autismo tem maior probabilidade de usar a ecolalia quando não conseguiu aprender uma resposta apropriada à pergunta.

Portanto, os profissionais e cuidadores devem observar atentamente a ecolalia para compreender seu propósito. Identificar se é uma resposta a estímulos específicos ou uma tentativa de comunicação é crucial.

Tratamento

O tratamento costuma ser multidisciplinar com a atuação de fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e psicólogos. E a intervenção deve se pautar na individualidade da criança. Portanto, o objetivo é fazer com que a criança autista ganhe autonomia e independência para conseguir se comunicar. Os especialistas devem realizar intervenções baseadas em evidências.

Pontos importantes:

Identificar as funções da Ecolalia: Identificar padrões e contextos em que a ecolalia ocorre pode fornecer insights valiosos sobre suas funções comunicativas. Determinar se a ecolalia está servindo como uma forma de autoestimulação, expressão de necessidades ou outra função. Isso pode orientar o desenvolvimento de estratégias específicas.

Incentivar a comunicação funcional: é essencial promover formas alternativas de expressão e comunicação para reduzir a dependência da ecolalia como principal meio de interação e desenvolver uma comunicação funcional.

Contextualizar e Respeitar: Reconhecer que a ecolalia muitas vezes desempenha uma função importante na vida do indivíduo, seja imediata, tardia ou mitigada, e abordá-la com respeito e empatia.

Além disso, é muito importante a participação dos pais e cuidadores que também devem receber orientação dos profissionais para estimular a comunicação funcional, generalizar as habilidades desenvolvidas e contribuir para a evolução da criança no dia a dia e nos contextos naturais.

Referências

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/19838574/

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/3215891/

https://www.verywellhealth.com/why-does-my-child-with-autism-repeat-words-and-phrases-260144

https://link.springer.com/article/10.1007/s40489-015-0067-4

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Dra. Fabiele Russo

Neurocientista, especialista em Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). Pesquisadora na área do TEA há mais de 10 anos. Mestre e Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP) com Doutorado “sanduíche” no exterior pelo Departamento de Pediatria da Universidade da Califórnia, San Diego (UCSD). Realizou 4 Pós-doutorados pela USP. É cofundadora da NeuroConecta e também, coautora do livro: Autismo ao longo da vida.