Aprendizagem escolar dos autistas (Ensino Fundamental e Ensino Médio): como vencer desafios

A aprendizagem escolar é uma das etapas que podem integrar o processo de desenvolvimento da pessoa com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA).

Por meio do acesso ao ambiente de ensino é esperado que a pessoa no espectro possa aperfeiçoar sua capacidade de integração social, ampliar sua percepção de mundo, além de ter acesso ao conhecimento por meio das aulas regulares do ensino fundamental e médio.

No Brasil, a legislação indica que a pessoa com TEA deve ter acesso à rede regular de ensino. É o que está expresso no artigo 3º da Lei Nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista – “São direitos da pessoa com espectro autista: IV – o acesso à educação e ensino profissionalizante”. E, ainda consta no mesmo documento o seguinte parágrafo: “Em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2º, terá direito a acompanhante especializado”.

É importante que pais e familiares, bem como a pessoa no espectro, tenham acesso à esta informação, para que tenham mais argumentos para lutar por seus direitos.

A escola é uma das ferramentas que podem possibilitar ao autista se preparar para a vida com mais independência e adquirir competências que o possibilitem ser elegível a uma oportunidade no mercado de trabalho.

Atualmente, no País, embora haja uma normativa que prevê a inclusão de quem tem TEA no sistema educacional, ainda pode se observar despreparo das instituições de ensino e seus profissionais em integrar e desenvolver os alunos no espectro por meio de uma educação especial – que os possibilite evoluir dentro do programa de ensino que lhes é proposto.

Espera-se que a educação inclusiva seja experimentada na prática e, com isso, haja a inclusão do aluno com TEA tanto no que cabe a assimilar o conteúdo que lhe é apresentado, quanto no que diz respeito à perspectiva de se socializar com os demais alunos, sem se deparar com barreiras de preconceito e exclusão, desenvolvendo assim suas habilidades de convívio, o que pode ser um desafio para o autista.

Estudantes com autismo apresentam diferenças entre si no que cabe à sua capacidade de interação social e muitas vezes têm dificuldade em estabelecer relacionamentos.

Estes desafios que têm com a comunicação social não devem ser vistas como falta de interesse ou de vontade, mas sim como um fator a ser desenvolvido com suporte pedagógico.

Da mesma forma deve ser conduzido o comportamento sensorial. Portanto, é indicado que a escola se adapte para receber o aluno com autismo e atende-lo em suas necessidades, oferecendo profissionais especializados, que possam promover esta integração e sejam facilitadores do acesso ao ensino.

O processo de inclusão no ensino regular requer atenção não apenas dos professores, psicopedagogos e demais membros da escola, mas também da família e do grupo de profissionais que acompanham o autista.

Juntos, poderão encontrar os mecanismos que possibilitarão auxiliar o autista a alcançar êxito no desenvolvimento cognitivo e interpessoal no ambiente escolar.

O aproveitamento escolar da criança com TEA está condicionado aos recursos que os professores irão lançar mão para despertar seu envolvimento com as atividades de ensino a ele apresentadas.

O educador precisa ter ciência de que o processo de aprendizagem com esta criança demandará tempo, constância e recursos didáticos que prendam a atenção do autista, visto que o déficit de atenção é uma das fragilidades decorrentes do distúrbio.

É possível lançar mão de atividades lúdicas, como brincadeiras e jogos que possibilitem interação social – uma das partes mais afetadas em quem tem TEA – e estímulos de raciocínio e motores.

Seja no ensino público ou privado, o importante é que a pessoa com autismo esteja integrada no meio ao qual foi lhe proposta inserção.

Outro aspecto é que se o conceito de “inclusão” não pode se limitar ao fato de inserir o autista na sala de aula e colocá-lo em todas as atividades propostas, mas sim o ambiente bem como as ações devem ser adaptadas às necessidades individuais destes estudantes com TEA.

As escolas precisam ter o cuidado de não correr o risco de uma generalização no trato com o autista, pois os alunos com autismo podem ser tão diferentes uns dos outros quanto qualquer outro aluno. Pontos como investir em capacitação de pessoal e melhorar as condições de ensino para os alunos com TEA também são fundamentais para alcançar um bom desempenho deste grupo de estudantes.

De acordo com levantamentos feitos pela Autism Cooperative Research Centre Australian Autism Educational Needs Analysis (ASD-ENA) – a chamada conexão escolar pode ser o instrumento que atua em prol da aceitação, respeito e apoio entre alunos num ambiente escolar.

Segundo a instituição australiana, a conexão da escola é tão importante para os alunos no espectro do autismo como para os demais (neurotípicos).

Recomendações

As principais recomendações apresentadas pela ASD-ENA centram-se em uma série de questões, que incluem:

  • O uso da tecnologia para apoiar as necessidades acadêmicas e de aprendizado dos estudantes
  • Apoio às necessidades da função executiva dos alunos (por exemplo, planejamento, organização, habilidades de gerenciamento de tempo) para poder fornecer apoio individualizado dentro e fora da sala de aula quando necessário
  • Suporte adicional quando a escrita manual for necessária para completar uma tarefa.
  • Atenção e suporte à criança quando exposta aos estímulos sensoriais presentes no ambiente (ruídos, luzes, odor e etc.)

Um dos métodos baseados em evidências científicas que podem ser utilizados pelas escolas é a Análise de Comportamento Aplicada (ABA). Esta pode ser uma ferramenta importante não só a gerenciar os desafios sociais e sensoriais do ambiente escolar, mas também o estresse e a ansiedade que eles podem experimentar neste espaço de ensino. Confira informações sobre este conceito aqui no site.

Você sabia?

De acordo com o Censo Escolar estima-se que mais de 698 mil estudantes especiais estavam matriculados em classes comuns em 2014. Entre este grupo estão incluídas pessoas com TEA.

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Referências:

Da redação. Autismo e escola: os desafios e a necessidade da inclusão. Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em <http://educacaointegral.org.br/reportagens/autismo-escola-os-desafios-necessidade-da-inclusao/> Acessado em 26 de outubro de 2017.

Governo do Brasil. Dados do Censo Escolar indicam aumento de matrícula de alunos com deficiência. Disponível em http://www.brasil.gov.br/educacao/2015/03/dados-do-censo-escolar-indicam-aumento-de-matriculas-de-alunos-com-deficiencia Acessado em 27 de outubro de 2017.

Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Brasil. Governo Federal. Disponível em http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2012/lei-12764-27-dezembro-2012-774838-publicacaooriginal-138466-pl.html Acessado em 24 de outubro de 2017.

Ministry of Education Teaching Students with Autism. A Resource Guide for Schools. British Columbia. Disponível em https://www2.gov.bc.ca/assets/gov/education/kindergarten-to-grade/-12/teach/teaching-tools/inclusive/autism.pdf Acessado em 26 de outubro de 2017.

Saggers, B. School connectedness for students on the autism spectrum

Teacher Magazine. Disponível em https://www.teachermagazine.com.au/articles/school-connectedness-for-students-on-the-autism-spectrum Acessado em 27 de outubro de 2017.

Saggers, BethKlug, DavidHarper-Hill, Keely, Ashburner, Jill, Costley, Debra, Clark, Trevor, Bruck, Susan, Trembath, David, Webster, Amanda A., & Carrington, Suzanne (2016) Australian Autism Educational Needs Analysis – What are the needs of schools, parents and students on the autism spectrum? Cooperative Research Centre for Living with Autism, Brisbane, QLD. Disponível em < https://www.autismcrc.com.au/sites/default/files/inline-files/Educational%20needs%20analysis%20-%20Final%20report.pdf> Acessado em 27 de outubro de 2017

Supporting students with autism in the classroom: what teachers need to know. The Conversation. Disponível em http://theconversation.com/supporting-students-with-autism-in-the-classroom-what-teachers-need-to-know-64814 Acessado em 25 de outubro de 2017.

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Dra. Fabiele Russo

Neurocientista, especialista em Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). Pesquisadora na área do TEA há mais de 10 anos. Mestre e Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP) com Doutorado “sanduíche” no exterior pelo Departamento de Pediatria da Universidade da Califórnia, San Diego (UCSD). Realizou 4 Pós-doutorados pela USP. É cofundadora da NeuroConecta e também, coautora do livro: Autismo ao longo da vida.